MAYSA, a biografia de uma das maiores intérpretes da música brasileira
Lira Neto retrata a complexa personalidade da cantora que traduziu a alma da vida boêmia, com base nos seus diários e pesquisa
“Deusa das canções de dor-de-cotovelo”, “rainha da música de fossa”, “Edith Piaf dos trópicos”, a cantora e compositora Maysa foi uma personalidade muito mais complexa do que sugere sua imagem pública. Intérprete de clássicos da música brasileira como “Ouça” e “Meu mundo caiu”, a artista nascida no Rio de Janeiro em 1936 é tema dessa biografia escrita pelo jornalista Lira Neto a partir de pesquisas em arquivos familiares, de entrevistas com cerca de 200 pessoas (parentes, amigos, ex-namorados, ex-maridos, músicos, produtores) e, sobretudo, com base no acesso irrestrito ao diário íntimo de Maysa. O resultado é um retrato cheio de nuances de uma cantora que não apenas se tornou um ícone da vida boêmia, mas foi ela mesma uma cronista da vida noturna, escrevendo as letras de muitas de suas canções – num trânsito incessante entre as figuras da musa e da poeta.
Maysa – Só numa multidão de amores percorre minuciosamente todas as etapas (e traumas) de uma trajetória marcada por amores, viagens, conflitos com a mídia, tentativas de suicídio, crises de alcoolismo e internações em clínicas para desintoxicação. Do convívio com o pai notívago e hedonista ao casamento com o magnata André Matarazzo (que impunha à esposa o recato das tradições familiares), da identificação visceral com a música romântica à assimilação das novidades estéticas trazidas pela Bossa Nova, Lira Neto compõe uma narrativa em que a fidelidade aos fatos e o exaustivo trabalho de prospecção permitem detalhar também o contexto sociocultural em que Maysa se tornou uma personagem tão célebre quanto a atriz Cacilda Becker, a pianista Guiomar Novaes, a tenista Maria Esther Bueno ou a escritora Rachel de Queiroz – todas elas protagonistas de uma sociedade em que a mulher tinha papel coadjuvante.
O livro traz algumas importantes revelações, como a de que a primeira gravação de “O barquinho” – canção de Ronaldo Bôscoli e Roberto Menescal que se tornou emblema da Bossa Nova – foi obra de Maysa, e não de Pery Ribeiro (conforme a versão corrente). Além disso, mostra como aspectos sombrios de sua personalidade eram vividos com intensidade e autoconsciência – como na passagem do diário em que a autora faz a seguinte anotação: “Há gritos incríveis dentro de mim, que me povoam da mais imensa solidão”.
Maysa, aliás, não era alheia à vida literária. Celebrada por Manuel Bandeira num poema que leva seu nome (“Os olhos de Maísa são dois não sei quê dois não sei como diga dois Oceanos Não-Pacíficos”, escreve o poeta recifense), ela se dedicou, nos últimos anos de vida, a alguns projetos teatrais: como mostra Lira Neto, em 1971 Maysa produziu e atuou na montagem da peça Woyzeck, do escritor alemão Georg Büchner (um precursor do expressionismo); e, em 1972, registrou em seu diário o projeto de montar Entre quatro paredes, de Sartre.
Mãe do diretor de cinema e televisão Jayme Monjardim, Maysa tentou, após inúmeras temporadas fora do Brasil reconstituídas por Lira Neto, retornar ao convívio familiar e refrear o ritmo de frenético de suas relações amorosas e de sua carreira artística: um acidente de automóvel na ponte Rio-Niterói em 1977, porém, interrompeu definitivamente essa vida que transformou o fracasso sentimental e a angústia existencial em sucesso artístico, em sublimação da dor pelo samba-canção.
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