Cê não vai crê no rock do Caê!

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Thiago Perpétuo · Brasília, DF
21/11/2006 · 89 · 5
 

Título rimado, texto descontraído. Apropriado, quero crer, ao artigo que segue, acerca do show de Caetano, o Veloso, que escolheu a Capital Federal para inaugurar a turnê do mais recente álbum, Cê, que traz como novidade, uma boa levada de roquenrôu. Não por acaso, aliás, a escolha de Brasília como ponta-pé inicial. A cidade ainda fervilha com o Rock, e tal ainda é a expressão mais comum de seus jovens, dignos e indignados, dos pensam e fazem, não dos que queimam índios, mas dos que ainda cantam Índios.

Fala Caetano

Para quem lembra com saudade da época dos festivais, ou mesmo para quem os tem apenas nas memórias que nos chegam pelos livros e discos, poderia prever que, senão um discurso inflamado, ao menos um discurso à lá Caê, haveria de se fazer ouvir no show. Simpático falastrão, ora nos surpreende com suas palavras certeiras, ora nos irrita com suas palavras ao vento, sem lenço, nexo ou documento. Polêmico, disse alhures que votara no Geraldo, o Alckmin, no primeiro turno, e que “deixaria o homem trabalhar”, no segundo, contemplando o presidente-operário no pleito.

Daí que numa de suas entrevistas, publicada num blog dum diário famoso de São Paulo, Caetano pode ver quase in loco a repercussão de suas declarações – tal é a interessante contribuição desta inter-relação blog-jornal. Segundo o músico, leu-as todas, e divertiu-se um bocado. “De lulistas a alckimistas, desagradei a todos”, declarou. “Sinto-me de volta aos velhos tempos, quando não agradava a nenhum lado da banda”, concluiu feliz com o resultado. Daí que, para prazer e deleite – talvez mais de Caetano que da platéia – fez questão de abordar destacadamente o melhor comentário do blog. “Uma pessoa interessantíssima assim falou: o problema não é quando Caetano abre a boca pra falar besteira, o problema mesmo é quando ele faz um voz-e-violão”. Risos gerais, e um brinde à platéia, que se divertia com as guitarras: foi lá o baiano tomar um violão e mostrar que ainda está em excelente forma quando sobe no banquinho.

Quatro fabulosos

Tudo no show foi um tanto simples. Muito enxuto. Um ar de faça-você-mesmo que contrasta com a muitas vezes proclamada extravagância tropicalista. No palco, de sóbria decoração, sem muitos salamaleques apesar da intensidade da cor roxa ao fundo (cor da capa do álbum), três jovem músicos acompanhavam o mestre, com carinho, que não parecia ter mais que os seus eternos vinte anos. Um pequeno erro no meio de uma das músicas, uma guitarra que não entrou: momento para pensarmos numa banda de rock iniciante, recém saída d’alguma garagem, nervosa com o público de Brasília – notório por ser inclemente com erros tais. Mais que nada, o carisma de Caetano driblou os mais ciosos. O sorriso eterno, esculpido em todos os filhos de Dona Canô, desculpou-se antes das palavras, e o público acompanhou.

Uma atmosfera de encanto e, por que não dizer, de compromisso com a atitude roqueira. Nas músicas do novo álbum executadas no espetáculo, solos de guitarra (de Pedro Sá) que flertavam, ora com a levada anos 80, ora com a psicodelia das distorções. Bateria (de Marcelo Callado) bem arrumadinha, dialogava com os sons e tons (nada geniais, lembremos, era apenas uma banda de rock de garagem) do teclado (de Ricardo Dias Gomes). O baixo (também de Dias Gomes), que também teve breves momentos de interferência no som, fez um bom feijão com arroz na “cozinha” da banda. E num dos grandes momentos, uma referência musical que ganhou contornos do bom e velho Blues, “Como dois e dois”, eternizada na voz de uma Gal, ainda fatal, ou na de um Roberto Carlos, ainda tremendão. Que voltem as guitarras.

Diamante em estado bruto

Um show com a cara de Brasília, um Caetano com cara de candango. Mas com certas falhas de repertório. Nada que rebaixe a qualidade do show, mas uma diferença que faria deste ótimo show, um show inesquecível. Já que a escolha da Capital do Rock foi emblemática para o show, e decisiva na composição do álbum, apareceram certas lacunas no set list. Como não relembrar uma Cássia Eller, expressão genuína deste tipo de revolta que fez do Rock o que ele é? Como não trazer de volta um Renato Russo, dos maiores poetas de nosso rock que, a fim destes tempos de política na veia, sempre nos fazem pensar Que País é Esse? Ambos mais criadores do que crias de Brasília, fariam um bem danado ao espetáculo.

Mas enfim, Caetano é Caetano, nicurí é o diabo. Êpa! Acho que acabei de relembrar de outro roqueiro que merecia uma referência.

PS: Caro (possível) leitor. Talvez você esteja pensando, “poxa, mas este texto ficaria mais interessante com uma foto”. Ao que concordo. Entretanto, a falta de imagens vai como um protesto ao irritante, e hoje em dia muitíssimo comum, hábito de fazer de nossas câmeras, instrumento de irritabilidade alheia. Ao lado das pipocas que vociferam impropérios quando mais nos concentramos nos cinemas, a etiqueta do bom comportamento, ou mesmo o básico do simancol deveria ser observado em certos shows. Uma foto aqui, outra ali, tudo bem, é interessante que se registre estes momentos. Agora, ficar pentelhando o resto da platéia só por que você – e mais 300 pessoas – quer usar todo o seu cartão de memória, e tirar 300 fotos do artista, todas com flash, de pontos diferentes do palco, sempre cutucando pessoas para levantar mais a câmera... porra, aí é demais. Enfim, grito a vocês meu protesto. Afinal, era mesmo um show de rock, mas se o ambiente fosse mais punk, não teria me furtado ao direito de arrancar uma cadeira da casa de espetáculos e partir pro ataque!!!

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Glês Nascimento
 

Que bom que você ultrapassou algumas barreiras e mostrou o show da visão que interessa: a do público. Vi e li entrevistas do Caetano na TV e nas revistas sobre o disco, mas é sempre bom a visão de um espectador do show.

Glês Nascimento · Palmas, TO 21/11/2006 18:54
1 pessoa achou �til · sua opini�o: subir
Andre  Intruso
 

.....so uma musica tem mesmo uma pegada rock roll..

Andre Intruso · Jaboatão dos Guararapes, PE 28/11/2006 20:10
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Waleska Barbosa
 

vc parou de escrever no seu blog? entrei lá e achei lindo - a estética, a escrita...

Waleska Barbosa · Brasília, DF 23/1/2007 15:11
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Andre  Intruso
 

...valeska.....eu??

Andre Intruso · Jaboatão dos Guararapes, PE 23/1/2007 19:03
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Waleska Barbosa
 

não... o Thiago!

Waleska Barbosa · Brasília, DF 24/1/2007 10:01
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